quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Dificuldades dos ritos afro-brasileiros na fogueira da cena

Cena de Fogueira, do Alvenaria - foto: Tiago Lima



Por Eduardo Bruno

O ritualismo está presente no teatro desde suas origens. Se nos remetermos à Grécia, lembraremos que o nascimento dos atos teatrais está vinculado às adorações de Dioniso. Mesmo que essa junção entre teatro e religião seja, ao longo da historia ocidental, quebrada e refeita, é quase impossível não pensar na ritualização presente no fazer teatral.

É no caminho mais marcante da ritualização que o espetáculo Fogueira, do Grupo Alvenaria de Teatro, da Bahia, resolve construir o que inicialmente podemos denominar de espetáculo. Esse estado de misticismo é percebido a partir do momento que o espectador chega ao local de apresentação - Centro Cultural Ensaio -, que por coincidência ou não tem vários incensos espalhados, o que já nos proporciona outra forma de perceber o espaço.

Logo de inicio os atuantes - melhor forma de descrever os atores que ali estão - nos recebem na porta da sala de apresentação, onde nos convidam a nos dispormos pelo espaço. Casa cheia, por isso, varia vezes somos remanejados, de forma bem humorada, para outras cadeiras. Naturalmente, sem ser necessário avisar, o público, começa a perceber que o espetáculo não vai pedir licença para começar, pois desde sua recepção já havia se iniciado. Na sala, disposto em uma grande roda, o espectador é convidados a observar inúmeras manifestações ritualísticas que são ritmadas por meio de sons de tambores e outros instrumentos que rapidamente nos remetem às religiões afro-brasileiras. Logo o ritual começa e já fica bastante claro que o local do público é, quase, o de observador de uma grande festa ritualística. Várias danças são feitas, representações de incorporações de entidade são mimetizadas, frases são faladas e pequenos comentários realizados, mas a sensação de observador não é desfeitas para o espectador.

Durante toda a apresentação, o público fica perto dos atuantes sendo tocado acidentalmente ou não por eles, o que, mesmo assim, não parece suficiente para quebrar a barreira de observador, além de não demonstrar claramente a real vontade de misturar criador e observador da experiência artística. Isso fica extremamente claro quando percebemos que nos momentos em que o atuante chega próximo para contracenar com o público, são gerados pequenos conflitos, pois o espectador parece não sentir um vínculo sensorial entre obra e público. Quanto mais o espetáculo vai se desenvolvendo, mais o público vai se distanciando do rito da obra, por outro lado, os atuantes vão se embriagando e mergulhando nas dança e nas musicas, essa dicotomia fica visível com o cansaço e o incomodo do observador do ritual.

Retomando o início do texto, desde a Grécia o rito está presente no teatro, porém, não havia uma separação tão marcada entre os observadores dos ritos e os seus realizadores, assim como nas manifestações afro-brasileiras. No espetáculo Fogueira, parece que esse local de intimidade com os ritos ali realizados ainda está bastante distante de ser sentido pelo espectador, chegando ao ponto do público não conseguir nem compreender quando o espetáculo terminou, pois os atuantes precisam ficar repetindo varias vezes: “O terreiro tem que esvaziar”.


Eduardo Bruno é graduando em Licenciatura em Teatro do IFCE e diretor do EmFoco Grupo de Teatro- Fortaleza/CE. eduardobfreitas@hotmail.com

(Texto produzido como exercício para a oficina Cultura da Crítica, no âmbito do FILTE. Não posuui caráter valorativo).

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