terça-feira, 11 de setembro de 2012

Prazeres e desconexões do estado hermético


Carolina Virgüez em Susuné... - foto: Silvana Marques

Por Poliana Bicalho

O espetáculo Susuné. Cuentos de mujeres negras, de Carolina Virgüez, que nasceu na Colômbia, estudou teatro na UNIRIO (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro) e completa 50 anos este ano, é um encontro com o universo das narrativas e da potencialidade de envolver seus interlocutores. Nesta encenação de Antônio Karnewale, micro-histórias ficcionais, baseadas em contos afrocolombianos de Amalialú Posso Figueroa, sob dramaturgia de Emanuel Aragão, se mesclam a fatos reais da vida da atriz/personagem.

O fio que conduz à macro-história é a investigação de quem sou Eu. Este ser historicamente construído. Para tanto, o espetáculo questiona: “Sou resultado do meio em que vivo? Eu me constituo a partir do olhar do outro?”. Apesar de tocar em assuntos contundentes e cada vez mais pertinentes no campo das artes, o espetáculo não convida o espectador a sair de seu lugar cômodo, pois os anseios não ultrapassam o proscênio, se resumindo assim, a uma elucubração dos artistas desta montagem.

A dramaturgia é imprecisa, e por mais que os contos sejam interessantes, por seus personagens fantásticos e plenos de simbolismo, eles não transpõem, resumindo-se a uma historieta banal. Também não é oportunizado ao espectador, ao longo do espetáculo, adentrar a essência do universo colombiano. Por outro lado, em diversas passagens, ao narrar fatos de sua vida, a atriz procura apontar onde este espetáculo começa a ser concebido, uma provocação sobre a lógica cartesiana na qual tudo precisa ter um inicio, meio e fim.

No palco, desponta a iconografia das vidas que compõe a encenação organizada em pequenos compartimentos e sinalizada por placas. E assim, como o movimento da vida, estes fragmentos se movem e se fundem, criando novas configurações para o espaço.

Para a criação deste espaço, um músico está na cena e em alguns momentos, contracena com a atriz a partir de instrumentos percussivos, contribuindo para quebrar a monotonia dos acontecimentos e para dar o necessário tom afrocolombiano à encenação. Por outro lado, o músico que possui uma boa presença, poderia estar inserido na narrativa de forma mais precisa, pois a oposição de seu corpo, negro e pesado, contrapõe ao corpo esguio, branco e índio da atriz. Há entre eles inúmeras possibilidades de movimentação cênica, além de uma discussão sobre os lugares ocupados por estes corpos neste caminho entre Brasil e Colômbia.

O figurino possui traços de atemporalidade e ancestralidade. No rodopio do corpo a roupa preenche o espaço com sua leveza, no entanto esta mesma roupa engancha e dificulta o caminhar da atriz nos compartimentos da vida.

A interpretação de Carolina é sutil tanto no seu humor quanto na sua ironia. E a plateia soltou risos fáceis diante dos indícios cômicos (mesmo que a proposta não fosse engraçada). O que não é para estranhar, quando se busca estabelecer diálogo com uma obra tão hermética.

Ao fim dos 60 minutos de espetáculo, fica a sensação de que houve uma experiência prazerosa, mas por outro lado fica a certeza de que algo não aconteceu, ou pelo menos se perdeu no caminho entre a obra de arte e o espectador. Porém, não houve enganos e as regras do faz-de-conta estiveram claras.

Poliana Bicalho é formada em Jornalismo e Licenciatura em Teatro, atua como produtora cultural freelancer e atualmente é professora da Escola de Dança da Fundação Cultural do Estado da Bahia. E-mail: polianabicalho@yahoo.com.br

(Texto produzido como exercício para a oficina Cultura da Crítica, no âmbito do FILTE. Não posuui caráter valorativo).

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